5 de fevereiro de 2018

A memória de locadora



Ficamos uns dias sem a tv por assinatura em casa. Aliado a outros fatores, foi entediante depender apenas da Netflix. Mas fui salva por uma memória de uns dez anos atrás, pelo menos. Já era o fim das locadoras, mas ainda havia uma em Água Fria, que funcionava em uma casa velha e com cheiro de madeira.

Na infância, eu vivia na locadora nos finais de semana. Era uma tarefa quase programada. Sabia que voltaria com três filmes – para assistir em videocassete - e que aproveitaria a promoção. Geralmente você locava um lançamento e ganhava catálogo. Ou algo assim. Mas o ruim de levar lançamento era que a gente tinha que devolver em 24h. Lembro que eu andava um tempão pelos corredores (não muitos, afinal, era Rio Doce) e olhava exatamente as mesmas capas da semana anterior. Você escolhia colorido e vinha numa caixa preta e branca. Havia as divisões por gênero e a famosa-parte-proibida-para-menores. E aquilo sempre deixava curiosidade. Mas não me atrevia.

Quando muito estruturada, ali mesmo eu já comprava salgadinho, confeitos e afins para minhas sessões. Geralmente, vinha “Nove Meses”. Eu não sei o que tinha nesse filme para me atrair tanto, mas o fato é que, por semanas, eu só voltava com ele e assistia mesmo. Ninguém lá em casa me acompanhava mais na sessão.

Eu gostava tanto de locadora que essa era uma das brincadeiras. Separava e catalogava as fitas do videogame, empinava o colchão, montava a TV (ligada no canal 3) e abria minha locadora. Eu só não tinha a inteligência de perceber que eu passava o dia vendo meu primo jogar, já que ele locava, e eu ficava ali só esperando o outro cliente entrar – o que nunca ia acontecer, não é?


Em menos de 20 anos, tudo mudou. Passamos a locar dvd, o que evitava o trabalho de rebobinar a fita e a pena de multa se não levássemos assim. Mas ali já era uma decadência desses espaços mesmo. Perdemos e ganhamos para a internet. Tudo está nas plataformas e me sinto velha falando isso. Foi muito rápido. Mas se tem uma coisa que não mudou foi o tempo que circulo nas categorias para escolher os filmes que vão para a infinita “minha lista” e os que pretendo assistir na hora. O prazer é o mesmo, mas ainda falta o cheiro da locadora que não volta mais, mesmo eu indo pelo Google Maps para reacender essa memória.
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